sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Da falta que faz


Eu queria te dizer que às vezes, escondido, eu olho aquela foto em que você está com o cabelo todo jogado e fazendo uma careta absurdamente ridícula do meu lado. E te dizer que às vezes, eu sentia vontade de te dizer que te amava desse jeito absurdamente ridículo que eu sei amar. Dessa maneira de vai-não-vai inquietante, insegura. Um dia eu quis te dizer que pude escutar tua voz chamando meu nome, e que pareceu tão real que eu fui conferir se não era mesmo você. Quem sabe fosse, com o vestido floral e perfume fresco que me fazia desviar os cabelos da sua nuca para eu grudar ali e nunca mais deixar de sentir aquele cheiro só seu.

Eu sinto sua falta. Eu sei que a culpa é minha. A culpa da discussão escandalosa, da porta trancada pra nunca mais voltar, a culpa do desfecho mal resolvido e da saudade que ficou. Quem sabe esta saudade ande passeando pela sua casa como ela aparece de surpresa por aqui quando eu acordo sem sentir seu corpo quente enroscado no meu braço. Nunca mais acordei com o perfume do seu cabelo jogado em cima do meu peito. Nunca mais te senti vívida dentro de mim.

Eu te espantei pra longe, menina, eu sei. Eu ignorei seus versos decorados e excluí da memória tuas cartas e frases soltas que me davam vontade de te pedir em casamento todos os dias. Mandei pra longe a lembrança do seu olhar misto em serenidade e mistério que me fazia querer descobrir todos os seus segredos, a sua gargalhada que me fazia rir, a sua maneira de passar o café enquanto eu te observava distraído. Eu quis esvaziar meu coração e minha casa de tudo o que lembrava você.

Minha mulher, minha menina. Minha. Você era minha e eu não sabia lidar com isso. Eu perdi o jeito de te fazer feliz. Um dia você chorou na minha frente e perguntava repetidamente se eu te amava. E eu não sabia como explicar que aquilo não parecia amor porque era muito maior e voraz do que amor. Me devorava por dentro e tirava a minha capacidade de percepção das coisas. Nunca consegui te dizer que eu tinha medo de te perder, que eu nunca quis perder isso que a gente tinha de deitar no seu colo assistindo TV e dividir o cobertor nesse frio que às vezes faz aqui sem dar a mínima para o que acontecia sala afora. E que por isso eu te mandei embora: antes que você fosse por conta própria.

A gente ainda joga um jogo estranho entre frieza e sumiço, orgulho e proteção. Eu já te perdi e a única coisa pior do que isso seria um dia te perder de novo. Então eu deixo ir. Eu deixo desaparecer os rastros do seus pés pequenos dentro dos meus chinelos, e finjo não ver os fios de cabelo comprido que às vezes ainda encontro enroscados no meu lençol. Esqueço a intimidade que a gente tinha de poder compartilhar o tudo ou o silêncio, a maneira como você gostava de falar uma bobagem que me fizesse rir sozinho lembrando depois. Não ouço mais nenhuma das músicas que você tivesse um dia comentado comigo, deixei escondida no armário a blusinha que você esqueceu aqui quando eu quis tirar você e tudo o que fosse seu da minha vida.

Eu nunca vou esquecer do dia em que, depois de tanto eu insistir, você se foi mesmo. Tento imaginar como eu poderia te explicar por quê te mandei ir dessa maneira tão assustadora e bruta. Talvez porque eu sinta medo, ou talvez porque alguma coisa ínfima nos nossos momentos de brigas me dissesse que nunca daria certo. Talvez, talvez, talvez. Acho que eu nunca vou saber. Só não quero enlouquecer sentindo o cheiro do seu perfume aparecendo na minha casa feito assombração, nem qualquer 'eu te amo' que você já tenha me dito em um momento que eu senti necessidade do seu cuidado. Eu só quero esquecer do quanto eu fui feliz. O problema nunca é o que vai; é sempre o que insiste em ficar dentro da gente.


Clarissa M. Lamega

3 comentários:

Anavlis disse...

Nossa! Clarissa! Virei sua fã. Parabéns pelo blog. A partir de agora acompanharei sempre. Fiquei arrepiada..
Parabéns, menina!

Ana Beatriz disse...

ótimo! parabéns mesmo

Clarissa M. Lamega disse...

Obrigaaada, meninas, de coração!
Fico muito feliz que tenham gostado...
Fiquem à vontade para palpitar, hahaha!

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