terça-feira, 20 de abril de 2010

Amanhã, quem sabe


Preciso me ver livre disso, que nem ao menos sei o que é. Só sei que aperta, machuca. Meus últimos dias têm passado lentamente, com essa dor indiscreta a me incriminar. Incriminar pelo quê? Ah, se eu soubesse! Me tira o ar enquanto ando a passos largos na rua, querendo chegar logo, quase correndo para alcançar - mas não sei o que busco. Imagine a cena: você entra no ônibus, não importa se está cheio ou vazio, se você está sentado ou em pé, nem para onde vai; mas entre no ônibus. Digamos que quando ele fecha as portas, algo belisca sua barriga, e não solta. Você esfrega as mãos encima, tenta aliviar a dor, verifica se não há nada prendendo sua barriga, e não há. Mas o beliscão continua pendurado ali, e seu destino não chega nunca. É assim que tenho vivido, esperando com um aperto do tamanho do mundo em um peito tão pequeno.
As coisas vão bem, levanto, estudo, percebo que nada mudou e tudo continua um tédio - então quero regredir e dormir novamente até o dia seguinte. Tenho tudo o que busquei, o que almejei até aqui, mas queria me sentir completa, talvez até um pouco feliz depois de ter alcançado meus sonhos. Mas já espero essa sensação há dias, olho no relógio, não posso mais esperar: preciso pegar o ônibus do sufoco antes que me atrase. Tudo ao redor corre perfeitamente bem, mas por que diabos continuo com esse buraco no peito? Acho que você deveria voltar, então. Tenho tentado seguir esses dias sem você para me cuidar, e por fora me escondo em sorrisos amarelos - e tudo bem, ninguém percebe. Mas por dentro, a coisa está feia. O que me corrói é o inside, o beliscão que deveria ser instantâneo e que não passa. Pare de me apertar, quero gritar. Me solta, me deixa livre, quero um amor bonito e tranqüilo. Mas isso não existe, amor moldado ao nosso gosto nunca vai existir. Então eu te mando embora, e você vai. Mesmo vendo você correr para longe, o aperto continua, e eu desejo que você não me obedeça mais, que você fique e espere e abrace e aceite meu choro de menina acostumada com facilidades. Não quero ser embalada pela dor, então que você me embale essa noite.
Me faça uma supresa, quem sabe amanhã. Bata à minha porta. Eu preciso tanto que você venha, que entre sem pedir, que me faça entender que é assim. Tenho medo da dor, mas ignore meu pedido para você ir embora. Só diga bem alto que fica - hoje, sempre - e repita várias vezes. Me tome nos braços, me dê um susto mostrando que você vai ficar, não importa o que aconteça, e me faça acreditar. Eu preciso saber que é você quem vai me arrancar desse ônibus de sufoco, que vai tirar o beliscão da minha barriga, que vai encher meu coração. Eu preciso ter certeza que você vai atolar esse vazio de coisas boas, trazer todas as suas coisas e móveis e adaptar meu coração para morar dentro dele. Abra as janelas, tire a poeira que se acumula nos cantos, me deixe mais calma. Me beije, tire esse susto, passe toda a sua saudade através dos seus lábios, e me diga que quer ficar. Mas não me peça permissão, pois não sei a hora certa de mandar em mim, e chega de doer! Apareça com sua bagagem e fique, tem espaço no coração.

Clarissa M. Lamega

4 comentários:

Ana Carolina disse...

"Eu preciso tanto que você venha, que entre sem pedir, que me faça entender que é assim."
simplesmente amei o post!!!

beiijo flor *.*

Mari. :) disse...

Lindo, você escreve muito bem! :)

Clarissa M. Lamega disse...

obrigada, meninas *-* o apoio de você é o que importa!
beijos

Milla disse...

Ficou muito lindo, tipo assim expressa tudo mesmo! Um máximo!

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