quarta-feira, 16 de junho de 2010

A amiga secretária




Às vezes em um surto meio caótico me dá uma vontadezinha curiosa de instalar uma secretária eletrônica à la filme norte-americano em casa - dessas que deixam nosso recado após o sinal; biip; e pimba! Assim eu te daria uma chance (mais uma, dentre bilhões) de me deixar um recado meio bobo, desses que a gente nem sabe o que falar mas quer que o outro saiba que pensamos coisas bonitas dele. Mais ou menos assim: "Oi... sou eu..." e já dá vergonha seguida de uma sensação de completa idiotice por ser ridícula a idéia de dizer 'sou eu' quando a gente tem certeza que a outra pessoa já decorou o timbre e decodificou cada milímetro do som da nossa voz. "...Então, eu só liguei porque ando pensando muito em você..." tempo para avaliar o peso sentimental da frase que acabou de te desarmar completamente. "...Me liga, tá? Vou esperar, tchau." E eu chego em casa e vejo seu recado, me jogo na cama mordendo os lábios e quase tendo um piritreco pelo turbilhão que acabou de me levar. Sorrio para o teto, sentindo como se de repente todos os vulcões do mundo entrassem em erupção junto com todos os prédios vindo à baixo, com bombas explodindo com maremotos e flores nascendo, e uma nuvem de borboletas se espalhando por tudo, ao mesmo tempo. Enquanto isso, faço a pobre da secretária repetir milhares de vezes a sua voz. Só para ter essa leveza de querer estar aonde se está ouvindo o que se queria ouvir, sentindo o gostosinho no peito que é te ter por perto. Calmo, por inteiro.
Ou então, depois de um dia horroroso e cheio de desastres aperto o botãozinho e escuto o recado: você tem uma nova mensagem. Me atento rapidamente enquanto escuto sua respiração ofegante dando arrepio no meu corpo todo. Até paro de tirar os sapatos por alguns segundos, fecho os olhos para sentir o ar quente saindo das suas narinas e percorrendo a distância entre a gente. De certo, estava distraído esperando minha voz te recepcionar, pensando no bonito que somos nós e que sou eu, e que é você, sem prestar atenção no sinal do recado. Se deparou com o silêncio e minha amiga secretária eletrônica te guardou pra me fazer uma surpresa depois. Nem cinco segundos respirando junto com você e ela anuncia o final da mensagem. Ah, mas essa maquininha é esperta!
Imagino também uma discussão besta (aonde minha especialidade é sempre ter orgulho ferido) e não te atender ao telefone de pura birra. É claro também que você demora a telefonar, me dando uma chance de assumir o posto humilde e telefonar antes. Como sempre, eu não telefono. E é até meio estratégico. Porque aí você liga e começa a falar após o "biip", mas sabe que eu estou ali te escutando e provavelmente aos prantos agarrada ao meu travesseiro. Começa então a conversar com a minha secretária, conta da mancada que deu comigo e como eu fui mesquinha, de como gosta de mim e da minha teimosia charmosa. Bate o pé, pergunta se a secretária acha que eu devia te atender e te perdoar. Eu começo a rir, com o traço visível de rímel escorrido no rosto e finalmente decido atender. Digo "bobo, você é mesmo muito bobo" rindo, e achando tudo aquilo absurdo e patético. Absurdamente necessário, quem sabe, pra que tudo dê certo.


Clarissa M. Lamega

terça-feira, 8 de junho de 2010




"Com um sorriso desses você não precisa de olhos."

Markus Zusak in A menina que roubava livros
"Como se dá a alguém um pedaço de céu?"


Markus Zusak in A menina que roubava livros
"É como se você soubesse o tempo todo que não devia fazer aquilo porque vai dar merda mas essa coisa é a coisa que você mais quer fazer. Então você decide e faz.. e aproveita que tá fazendo merda. Aproveita e é feliz. Mesmo que por pouco tempo. Mas ainda assim é."

Autor desconhecido

comunidade do orkut: http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=38893554

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Medo: paciente sem hora marcada



Eu sou tão arisca que tenho medo de qualquer coisa que se mexa, inclusive - e principalmente - um coração que bata próximo ao meu. Sempre fui assim meio bicho do mato, quase que selvagem, sabe? Mas nesses raros momentos em que isso se comprova, levo o susto de saber que realmente se é. E quero gritar, fugir, correr, ficar e aceitar tudo ao mesmo tempo. Sabe quando a gente quer muito uma coisa, e quando está a um centímetro de alcançá-la dá vontade de largar tudo e sumir? É um medo tão íntimo, quase que um medo de ser feliz. Mas a gente não devia ter medo de ser feliz, não mesmo. Medo de arriscar, de se jogar, de deixar fluir e viver o agora. Sua mão está estendida aqui e agora, e eu que esperei tanto não sei se serei capaz de segurá-la. Não consigo definir esse bicho de sete cabeças que se esconde em tudo o que seja próximo de um estado pleno de felicidade, esse frio na barriga que deixa a gente com medo. Normalmente, em tudo, eu diria SIM, quero, vou entrar nessa e me jogar, e achei que agora também diria sim. A pergunta foi feita e estou paralisada diante de tudo querendo sumir para não responder, recebendo uma descarga de adrenalina como se fosse o fim do mundo chegando. Pra dizer bem a verdade, é longe, muito longe do fim do mundo - e pode até ser o começo de tudo. O coração tá batendo, não pára, e tudo pulsa em pegar ou largar. Pegar ou largar? Fugir ou ficar?

Clarissa M. Lamega
"Será que eu já posso enlouquecer, ou devo apenas sorrir?"

Pitty - Me adora

quarta-feira, 2 de junho de 2010

A grande falta



Sinto falta de como era abrir a porta de casa e encontrar sua blusa jogada desastrosamente em cima do sofá. Eu surtava de mil maneiras possíveis, porque eu sempre te pedia pra não fazer aquilo que tanto me irritava. Então hoje, e estes dias todos, o que eu mais queria ver era essa bendita blusa com o seu cheiro esparramada na sala. Sempre que eu abria a porta, fazia uma oração na cabeça e pedia para ter os vestigios da sua presença na entrada de casa. E tudo o que tanto me irritava em você, eu pedia cinco mil vezes em pensamento de dorzinha sufocada para ter comigo.
Se eu entrasse pela porta e visse sua blusa - aquela que quase tinha virado segunda-pele, de tanto que você usava - escancarada em qualquer lugar da sala, juro que eu não ia ter nenhum piripaque nervoso. Nem se eu encontrasse seus sapatos jogados de qualquer jeito no chão, se eu visse terra no tapete, as janelas que você deixava escancaradas mesmo após anoitecer, se eu ouvisse do outro lado da casa sua voz me provocando para brigar por coisas banais, ou a pia cheia de louça e a mesa com farelos de pão. Coisas em você que me irritavam tanto, e que eu amaria receber mesmo que em migalhas, agora.
Fecho os olhos bem forte - como quando a gente quer fazer um pedido muito especial e bonito - e peço a Deus, com fé, que quando eu girar a chave e abrir a porta a sua blusa esteja ali, perfumando a sala com o cheirinho da paz que eu tenho em você. Peço com força, e boto fé com a inocência de uma criança que acredita que pode ter tudo o que deseja se persistir e acreditar firme naquilo. Abro a porta bem devagarzinho para dar o gostinho de magia que faz morder os lábios quando de surpresa achar você e sua blusa no sofá. Não foi dessa vez. Todos os dias, o mesmo ritual. E, apesar de todos aqueles móveis, enfeites, porta-retratos, a casa parece mais vazia do que nunca. Será que o vazio, quando é grande demais, pula pra fora e se espalha por tudo?

Clarissa M. Lamega
 
Só enquanto eu respirar. Design by Exotic Mommie. Illustraion By DaPino