Lá está você, com toda a sua onipresença me seguindo enquanto eu vou ao mercado, atravesso a rua, corto o cabelo, paro para ler em uma praça, atravesso a rua distraída, assisto tevê num imenso sofá vazio. Pelo menos, gosto de pensar que você está comigo. E se faço um bolo, lembro do dia em que você melou os dedos no chantily do bolo de mercado e lambuzou meu nariz, minha boca e meu rosto. Aí eu lambuzei o seu, feito duas crianças. Tomo café e lembro sua preferência: só com leite. Mudo os móveis de lugar, redecoro a casa, apareço nas festinhas dos amigos e nada enche esse vazio no peito. Esses dias decidi mudar meu quarto. Enquanto arrastava a cama do lugar, perdido perto do canto da parede encontrei, adivinhe: aquele pé de meia que você perdeu e foi trabalhar só com o outro. Ri sozinha lembrando da sua indignação diante do meu ataque de risos histérico. Me dei ao luxo de ter um dia de nostalgia. Fui na cafeteria aonde pedíamos o nosso "expresso duplo e capuccino cremoso" nas tardes de terça entediantes, sentei na "nossa mesa", rabisquei o guardanapo aonde costumávamos escrever uma palavra intrigante e observar de fora a expressão de quem lia. Vi na floricultura um rapaz com um buquê imenso de rosas vermelhas, e me lembrei imediatamente do quão romântico você foi ao me entregar rosas quando eu convenci minha mãe a não viajar conosco. Folheei o livro que você me deu de aniversário, li a dedicatória tímida, tirei nossas fotos e suas cartas de dentro da caixa para olhar. Lembrei do dia em que chamei seu irmão de "docinho" no telefone, pensando que era você, e da vez que gritei com você pelo telefone e logo depois bati à porta da sua casa com o urso que você me deu debaixo do braço e chinelos, pedindo para dormir com você. Assisti o filme que vimos no cinema no nosso primeiro encontro, vesti seus chinelos tamanho 42 por um dia inteiro, tirei sua blusa (que você esqueceu comigo) do guarda-roupa e deixei seus cheiro se misturar com o meu. Chorei um pouco lembrando do último beijo e da última vez que passeamos de mãos dadas, das brigas intermináveis e da última palavra. Chorei lembrando que fiquei com o telefone no ouvido escutando o "tu tu tu" depois de você ter desligado. Passei na frente da sua casa, fiquei parada um pouco vendo as luzes dos cômodos se acenderem e se apagarem, fui embora. Lembrei de quando você me aninhou na rede, lá na praia, e cuidou de mim quando eu me gripei e fiquei de cama. Comprei o sabor de sorvete que você gosta e comi sozinha assistindo um filme deprê. Li umas revistas que você achava a maior bobagem do mundo, escutei a "nossa música" no repeat do rádio. E sabe de uma coisa? Nada que eu faça vai diminuir a dor da perda, então quero mais é sentir cada milímetro de você dentro de mim. Dói sim, é difícil sim. Mas te lembro e te curto em cada detalhe do que ficou: desde uma meia embaixo da cama até uma frase sua cochichada no pé do ouvido. Sinto você perto de mim todos os dias, e sei que foi bom o que passou. Mesmo longe, pensa em mim também, tá?
Clarissa M. Lamega
2 comentários:
Bonito quem sabe viver e respeitar cada momento, inclusive os momentos de perda.
Gosto muito do que você escreve. =)
um abração
Obrigada, Amanda! Apareça sempre, deixe sua opinião que eu vou adorar saber (seja qual for!). E que respeitemos nossos momentos, que espero que sejam bons em sua maioria ;D
beeijos
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